Já parou pra pensar que quando uma empresa demite um funcionário, existe uma grande chance de dar errado?
Há muitos anos atrás, eu mesmo trabalhei numa agência de publicidade em Campinas, e como era 2013 e a agência ainda era pequena, o pessoal ali ainda trabalhava CLT, ao invés do monte de PJ que grassa nesse ramo. Um dos funcionários foi demitido sem justa causa, mas na data errada. Ele foi mandado embora antes da data base de correção salarial e aí a demissão foi revogada, e a agência precisou ficar com um funcionário mais 2 meses bastante a contragosto em ambas as partes: o rapaz que fora demitido e sabia que teria de cumprir mais 2 meses até seu desemprego logo ali, e a empresa que não poderia ter certeza de um trabalho bem feito ou mesmo que ele não acabaria causando algum mal de alguma forma como represália.
Eu não sei dos pormenores mas eu sei do tempo que ele voltou depois de ser demitido, soube que foi por causa da data de reajuste salarial e que fora um acordo entre o ex-funcionário – agora re-funcionário – e a empresa. O climão era diário, e por dois meses essa situação se arrastou até que a demissão finalmente aconteceu.
É por essas e outras que a demissão de um funcionário deve ser uma coisa bem pensada, planejada e quando executada, o cuidado e o respeito devem ser a base de tudo – especialmente quando se fala de empatia, onde o gestor deveria se colocar no local do profissional demitido e pensar como ele gostaria de passar por isso. Por isso, uma demissão nunca é uma coisa de um dia apenas – é um processo que tem várias fases, onde uma delas é a comunicação com o funcionário.
A primeira fase é a análise criteriosa da situação. antes de sair cortando vínculos empregatícios a esmo, buscar entender qual é a fase a qual a empresa se encontra, qual é o momento do mercado, qual o contexto corrente e quais as opções a serem consideradas para resolver o problema que leva a crer que demitir é uma solução. Há outras saídas, outros cortes de custos que possam ser feitos que surtem o efeito desejado? É possível remanejar o pessoal?
Mas, há também o caso onde a demissão é necessária pois o funcionário apresenta resultados ruins, uma postura ruim ou é algo para justa causa, em função de alguma ação indevida que tomou durante seu período de trabalho. Neste caso, o corte é necessário e não pode esperar muito para ser feito: quanto antes, melhor, pois a espera, especialmente quando o funcionário sabe o que vai acontecer, é péssima, e dá a entender que a empresa está se aproveitando do funcionário de alguma forma.
Feita a análise e foi entendido que deve haver uma demissão – uma ou várias – é recomendável que as razões que levam a escolha dessa ou dessas pessoas para que sejam desligadas da empresa, e aqui o motivo deve ser explicável e justificável, que possa ser falado sem rodeios e que seja verdadeiro.
Com isso em mãos, e sabendo que se quer fazer uma demissão humanizada, é ineteressante fazer um roadmap: um cronograma das ações a serem tomadas até o fim do processo, de maneira que nada fique solto e que não tenha nenhuma pendência especialmente após a saída do funcionário. Com esse roadmap nas mãos, fica mais simples saber o que, como e quando deve ser feito, especialmente sobre a documentação.
A demissão possui uma fase documental que precisa ser muito bem observada, para não dar margem para ruídos na comunicação e para que o gestor tenha todo o material em mãos quando se reunir com o funcionário. Neste ponto, incluir os valores e os recebimentos devidos e o porquê de cada valor é crucial: é neste ponto que muitos ex-funcionários acabam entrando com processos trabalhistas por não terem os valores que acham devidos, ou porque algum documento faltou. Este é o trabalho de backstage que mais importa e precisa ser muito bem feito. Sugerimos inclusive que o RH ofereça, junto com a documentação para o gestor, um roteiro de apresentação de cada documento, valor e cálculo. Quanto mais equipado para dúvidas, melhor.
Este é o processo pré-demissional: a análise até a reunião de documentos e o estabelecimento do cronograma de ações – todas com propósitos bem definidos e nenhuma chance de perguntas que não possam ser respondidas. A partir daqui, é a colocação de todo este plano em ação.
Com as razões, valores e documentos reunidos e dentro da lei, é o momento de chamar o funcionário. Para esta reunião, o melhor a ser feito é o gestor imediato fazer esta reunião, num local fechado, ode se possa falar sem interrupções, de maneira que haja espaço e tempo para uma conversa franca. É aqui que vai ser explicadso o motivo da demissão, mas que se deve agradecer pelos serviços prestados, reconhecer os esforços e explicar cada documento, assinatura e valor rescisório. É neste momento que o agora ex-funcionário deverá ter um momento aberto para que possa falar, e uma dica: é aqui que podem estar informações importantes sobre a empresa, seu clima e até mesmo ideias que não apareceriam de outra forma. Se puder criar um ambiente onde essa conversa seja possível, é uma “entrevista de saída” que tem muitos insights.
Ao final dessa reunião, o ex-funcionário deve ter a oportunidade falar com quem quiser de sua equipe e de outras na empresa, para poder se despedir e sair pela porta da frente com a mesma dignidade com a qual entrou. E é neste momento, após essa porta se fechar, que o gestor deverá comunicar aos funcionários remanescentes o que houve, porque houve e que não haverão novas demissões, se isso for possível. Caso hajam mais demissões a caminho, é importante que cada gestor com cortes na equipe se reúnam com os membros e avisem que haverão cortes e que os escolhidos serão contatados pessoalmente. Pode parecer que não, mas se as pessoas souberem diretamente doa gestão sobre as demissões, e não pela famosa “rádio-peão”, o clima da empresa fica melhor e com menor desconfiança.
Feitas as comunicações com a equipe ou com as equipes sobre o desligamento, de forma oficial, o processo de demissão pode ser considerado completo.
Para acabar, pense da seguinte forma: todo este processo tomou um bocado de tempo, e até mesmo um certo capricho que ás vezes nós nos esquecemos de ter no dia a dia. Mas entre abre aspas Perder fecha aspas um ou dois dias de trabalho do RH para levantar dados, cálculos, documentações e datas, e correr o risco de um processo trabalhista, qual dos dois dá mais trabalho?
E olha só, no esforço de marketing para vender sua empresa como solucionadora de um problema no mercado, uma demissão dessas cria um advogado da marca, ou ao menos neutraliza um detrator, que não vai falar mal da sua empresa quando tiver a chance. É uma questão de pensar cinco minutos e perceber que demitir não precisa ser como se desfazer um problema tóxico, ou um processo impessoal e rápido, mas que pode, se não gerar um advogado da marca, neutralizar um possível detrator.